domingo, 16 de março de 2008

Exposições que se completam – parte III

"Alexader Rodchenko – Revolution in Photography" é uma mostra das fotografias desse artista que transitou pela pintura, arquitetura, design, mas que elegeu a imagem fotográfica como o melhor veículo para expressar sua criatividade.
Rodchenko nasceu em São Petersburgo e bem jovem ingressou na escola de arte Kazan Art School, a fim de aprender pintura. Lá, conheceu o poeta Vladimir Mayakovsky, de quem seria amigo e parceiro, e Varvara Stepanova, que se tornaria sua esposa e modelo.
A exposição na The Hayward mostra as principais obras de Rodchenko relacionando-as com as etapas de sua vida. Logo no início, há cartazes de propaganda do governo soviético, sendo que o mais famoso é o da moça com lenço na cabeça, mão junto à boca, chamando os camaradas para se unirem a tal e tal ideal de igualdade, etc. A imagem foi copiada pelo grupo de rock escocês Franz Ferdinand na capa de seu terceiro CD You could have it so much better (2005).
A moça sardenta foi clicada sorrindo em close e de um ângulo que faz com que a foto pareça ter sido tirada ontem, e não no início do século XX. Mais adiante, ficamos sabendo que ela era casada com o crítico Osip Brik, mas também amante de Mayakovsky. Isso não impedia que todos fossem amigos, e que outra foto os mostre reunidos – Lili, Osip, Mayakowsky e Varvara –, sentados à mesa em frente a xícaras de chá, num clima bastante harmonioso.
Vale dizer que a base de muitos dos cartazes são as fotos de Rodchenko, mas em cima delas ele criava desenhos geométricos coloridos e aplicava tipologias incomuns, criando um efeito que continua atual e surpreendente até hoje.
Mais adiante, uma parede contém fotomontagens que ele criou para as revistas LEF (Left Front of the Arts, editada por Mayakovsky e dedicada a definir uma "direção comunista para todos os tipos de arte") e USSR in construction. O programa da exposição conta que, para reunir as imagens de que necessitava, Rodchenko comprava jornais e revistas, espalhava-os abertos no chão e ia recortando o que lhe chamava atenção, e depois empilhava em grupos: animais, moda, tecnologia.
Continuamos andando e surgem os registros que "tornaram a fotografia não apenas um meio de refltir a realidade, mas um veículo para representar visualmente as dinâmicas construções da mente". Enquadramentos inovadores, ângulos inusitados, efeitos geométricos. Por exemplo, uma mulher sobe uma escadaria com uma criança no colo e os degraus sob seus pés são listras enviesadas. O retrato da mãe é um close escuro onde se vê cada ruga da rosto rechonchudo da mulher. Mayakowsky é retratato várias vezes, rosto másculo, olhar penetrante. Um homem bonito!
Infelizmente, esse olhar inovador foi o mesmo que fez com que Rodchenko caísse em desgraça. Ao fazer um ensaio sobre o heróico e revolucionário povo russo, fotografou um "pioneiro" tocando corneta de baixo para cima e foi acusado pelas autoridades de ter "deformando" a imagem – e, conseqüentemente, seu conceito. Logo, veio uma lei que tornava obrigatória a permissão governamental para tirar fotos em locais públicos. Rodchenko, então, passou a dedicar-se ao fotojornalismo fotografando paradas militares, competições de atletismo, o teatro e o circo. Somente um ano após sua morte, Moscou viu a primeira exposição individual de seus trabalhos, organizada por Varvara.
Ao fim da mostra, fico pensando em porque Rodchenko não fugiu da União Soviética e refugiou-se na Europa, como outros artistas da sua geração. Por amor a seu país e à revolução a qual se engajou, ele permaneceu mesmo tendo sua arte incompreendida e desmerecida. Viu amigos como Mayakowsky se suicidarem, desiludidos com os rumos que seus sonhos tomaram na realidade. Por que não foi embora?
É uma pergunta sem resposta.

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